Esta é a carta de Sheryl Sandberg, a executiva do Facebook que perdeu seu marido de forma inesperada e trágica, acidentou-se praticando exercício físico em um esteira e teve traumatismo craniano. Eles estavam de férias no México.
No dia dois de maio ela viu seu mundo cair e no dia dois de junho fez nós, espectadores de um mundo sem fim que é a internet, criarmos uma empatia e a entender a perda da pessoa que amamos. Li no site da Exame.
"Hoje é o fim do 'Sheloshim', os primeiros trinta dias de luto, para
meu amado marido. O judaísmo denomina de 'Shiva' um período de intenso
luto, que dura sete dias após o enterro de alguém querido. Depois do
Shiva, a rotina pode voltar ao normal, mas é o fim do Sheloshim que
marca a realização completa do luto por um cônjuge.
Um amigo de infância, que agora é um rabino, recentemente me disse que a
oração mais poderosa que ele já leu foi: 'não me deixe morrer enquanto
ainda estiver vivo'. Eu nunca teria entendido essa oração antes de
perder Dave. Agora eu entendo.
Penso que, quando uma tragédia acontece, ela nos apresenta uma escolha.
Você pode se render ao vazio que enche seu coração, seus pulmões, tira
sua capacidade de pensar ou até mesmo de respirar. Ou você pode tentar
encontrar o sentido de tudo isso. Nesses últimos trinta dias, eu fiquei
perdida no vazio por muitos momentos. E eu sei que muitos momentos
futuros serão consumidos do mesmo jeito por esse mesmo vazio.
Mas, quando eu posso, eu quero escolher a vida e o significado.
E é por isso que eu estou escrevendo: para marcar o fim do Sheloshim e
dar de volta um pouco do que os outros têm me dado. Enquanto a
experiência de doar é profundamente pessoal, a braveza daqueles que
compartilharam suas próprias experiências tem me ajudado a me recolocar
nos eixos. Alguns dos que abriram seus corações foram os meus amigos
mais próximos. Outros foram totais desconhecidos que compartilharam
sabedoria e conselhos publicamente. Então, eu estou compartilhando o que
eu aprendi, na esperança de que isso ajude outro alguém. Na esperança
de que exista algum sentido para esta tragédia.
Eu envelheci trinta anos nestes trinta dias. Eu estou trinta anos mais
triste. Eu me sinto como se fosse trinta anos mais sábia.
Eu ganhei um entendimento bem mais profundo de o que é ser uma mãe, com
a agonia que eu senti quando meus filhos gritaram e choraram, e com a
conexão que minha mãe teve ao sentir meu sofrimento. Ela tem tentado
preencher o vazio na minha cama, me abraçando firme toda noite enquanto
eu choro até dormir.
Ela tem lutado para segurar suas próprias lágrimas para dar lugar às
minhas. Ela tem me explicado que a angústia que eu estou sentindo é ao
mesmo tempo minha e dos meus filhos, e eu entendi que ela estava certa
quando eu vi a dor nos olhos dela.
Eu aprendi que eu nunca vou realmente saber o que dizer para outros que
precisam de conforto. Eu acho que eu entendi tudo errado antes; eu
tentei afirmar a todo mundo que eu estava bem, pensando que a esperança
era a coisa mais confortável que eu poderia oferecer. Um amigo meu com
câncer avançado me disse que a pior coisa que as pessoas podem dizer a
ele é: "tudo vai ficar bem". Aquela voz na cabeça dele ficava gritando:
"como você sabe que tudo vai ficar bem? Você não entende que posso
morrer?". Eu aprendi nesse último mês que ele estava tentando me
aconselhar. A real empatia é, às vezes, não insistir que tudo vai ficar
bem, mas saber que provavelmente não vai.
Quando as pessoas dizem para mim "você e seus filhos irão encontrar a
felicidade de novo", meu coração me diz: "sim, eu acredito nisso, mas eu
sei que eu nunca mais vou sentir o prazer puro novamente". Aqueles que
têm dito "você irá encontrar um 'novo normal', mas nunca será tão bom
quanto antes" me confortam mais porque eu sei que eles estão falando a
verdade.
Até um simples "como você está?" - na maioria das vezes, perguntado na
melhor das intenções - seria melhor substituído por um "como você está
hoje?". Quando me perguntam "como você está?", eu me esforço e me impeço
de gritar: "meu marido morreu há um mês, como você acha que eu estou?".
Quando eu escuto "como você está hoje?", eu percebo que essa pessoa
sabe que o máximo que consigo fazer agora é viver cada dia.
Eu tenho aprendido sobre algumas coisas práticas que importam. Sabemos
agora que o Dave morreu imediatamente, mas eu não sabia disso na
ambulância. A ida até o hospital foi completamente lenta. Eu ainda odeio
cada carro que não deu passagem, cada pessoa que se importava mais em
chegar ao seu destino alguns minutos antes do que dar passagem para nós
passarmos. Eu notei isso enquanto eu dirigia em diversas cidades e
diversos países. Vamos todos sair do caminho! O pai, parceiro ou filho
de alguém talvez dependa disso.
Eu tenho aprendido o quão efêmera cada coisa pode ser sentida, e talvez
isso seja tudo. Que qualquer que seja o "tapete" em que você esteja,
ele pode ser puxado de você sem nenhum aviso. Nos últimos trinta dias eu
ouvi de várias mulheres que perderam os maridos que vários tapetes
foram puxados. Algumas suportaram e lutaram sozinhas com o sofrimento
emocional e a insegurança financeira. Me parece tão errado que nós
abandonemos essas mulheres e suas famílias quando elas mais precisam.
Eu tenho aprendido a pedir ajuda, e tenho percebido o quanto de ajuda
eu preciso. Até agora, eu tenho sido a irmã mais velha, a diretora de
operações, a doadora e a organizadora. Eu não planejei isso, e quando
aconteceu, eu não era capaz de fazer a maioria das coisas. Os mais
próximos a mim foram os que comandaram tudo. Eles planejaram. Eles
arrumaram. Eles me disseram para sentar e me lembrar de comer. E ainda
fizeram muito para apoiar a mim e aos meus filhos!
Eu tenho aprendido que a resiliência pode ser aprendida. Adam Grant me
ensinou três coisas que são essenciais para a resiliência e que eu posso
aprender todas elas. Personalização: admitir que não é minha culpa. Ele
me disse para banir a palavra "desculpa". Para dizer a mim mesma várias
e várias vezes que não é minha culpa. Permanência: lembrar que eu não
vou me sentir assim para sempre. Que vai ficar melhor. Infiltração: isso
não vai afetar cada parte de mim. É a habilidade de permanecer
saudável.
Para mim, começar essa transição de voltar para o trabalho tem sido
salvadora, a chance de me sentir útil e conectada. Mas eu descobri que
mesmo essas conexões mudaram. Muitos dos meus colegas de trabalho têm um
olhar de medo quando se aproximam de mim. Eu descobri que eles queriam
me ajudar mas não tinham certeza de como fazer isso. "Devo mencionar
isso? Não devo falar disso? Se eu falar, o que diabos vou dizer?". Eu
percebi que, para restabelecer a proximidade com meus colegas que sempre
foram importantes para mim, eu precisava deixar eles entrarem. E isso
significava ser o mais aberta e vulnerável que eu podia.
Eu disse para aqueles com quem trabalho mais que eles poderiam me fazer
perguntas honestas, e eu iria responder. Também disse que tudo bem se
eles quisessem falar de como eles se sentiam. Uma colega admitiu que
estava dirigindo até minha casa frequentemente, em dúvida se entrava ou
não. Outro disse que ficava paralisado quando eu estava por perto,
preocupado que talvez dissesse a coisa errada. Falando abertamente do
medo de dizer e fazer alguma coisa errada. Um dos meus desenhos
favoritos de todos os tempos é um elefante na sala do telefone, escrito
"isso é o elefante". Uma vez que enfrentei o elefante, nós pudemos tirar
ele da sala. (Nota da tradução: a expressão em inglês "elefante na
sala" significa quando uma verdade é tão óbvia que não dá para ser
ignorada).
Ao mesmo tempo, há momentos em que eu não consigo deixar as pessoas
entrarem. Eu fui a uma noite na escola quando as crianças mostram aos
pais os desenhos nas paredes das salas de aula. Muitos dos pais, os
quais também têm sido muito gentis, tentaram fazer contato ou falar algo
que eles pensavam ser confortável. Eu olhava para baixo o tempo todo,
para que nenhum deles me olhasse nos olhos, com medo que isso me
deixasse pior. Eu espero que eles tenham entendido.
Eu tenho aprendido sobre gratidão. A verdadeira gratidão pelas coisas
que eu tomava como garantidas antes, como a vida. Como alguém de coração
partido, eu olhava para meus filhos todos os dias e agradecia por eles
estarem vivos. Eu aprecio cada sorriso, cada abraço. Eu não vejo mais
cada dia como garantido. Quando um amigo me disse que ele odiava
aniversários e, por isso, não os celebrava, eu olhei para ele em meio a
lágrimas: "Celebre seu aniversário, caramba! Você tem sorte de ter cada
um deles". Meu próximo aniversário vai ser muito deprimente, mas estou
determinada a celebrá-lo no meu coração mais do que eu jamais celebrei
um aniversário antes.
Eu sou realmente agradecida aos muitos que ofereceram sua simpatia. Um
colega me disse que sua esposa, quem eu nunca conheci, decidiu mostrar
seu apoio indo de volta à escola para obter seu diploma, coisa que ela
estava enrolando por anos para fazer. Sim! Quando as circunstâncias
permitem, eu acredito, mais do que nunca, em aprender. E muitos homens,
alguns que eu conheço e outros que eu sei que nunca irei conhecer, estão
honrando a vida de Dave passando mais tempo com suas famílias.
Eu não consigo expressar a gratidão que eu senti à minha família e aos
meus amigos que têm feito tanto para me ajudar, e continuam fazendo. Nos
momentos brutais quando eu sou preenchida pelo vazio, quando os meses e
anos me parecem vazios e intermináveis, só as faces deles me colocam de
volta nos eixos. Minha gratidão por eles não tem fim.
Eu estava falando para um desses amigos sobre as atividades de pais e
filhos que Dave não está aqui para fazer. Nós pensamos num plano para
colocar ele nisso. Eu chorei para ele e disse "mas eu quero o Dave, eu
quero a primeira opção". Ele colocou o braço em volta de mim e disse "a
primeira opção não está disponível, então fique satisfeita com a opção
B".
Dave, para honrar sua memória e colocar pra cima seus filhos como eles
merecem, eu prometo fazer tudo que eu posso para me satisfazer com a
opção B. E mesmo quando o 'Sheloshim' acabe, eu ainda estarei em luto
pela opção A. Como Bono cantou "there is no end to grief... And there is
no end to love".
Eu te amo, Dave."
Eu te amo, Dave."
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